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10 anos de Aprendizagem Socioemocional: o que aprendi, o que ficou e o que muda


"Adapte o que é útil, rejeite o que é inútil, adicione o que é especificamente seu.” - Bruce Lee
"Adapte o que é útil, rejeite o que é inútil, adicione o que é especificamente seu.” - Bruce Lee

Dez anos. O tempo de uma década inteira observando como uma geração cresce — e como nós, adultos, ainda tateamos no escuro quando o assunto é preparar crianças para um futuro que mal conseguimos imaginar.

Lembro vividamente de olhar para meus filhos ao voltar do Fórum Econômico Mundial, em janeiro de 2014, e pensar: “Nenhum sistema — especialmente em países de dimensões continentais — se adaptará a tempo para preparar a geração que está na escola ou entrando no mercado de trabalho para o tsunami que se aproximava silenciosamente.”

Ainda no Fórum Econômico Mundial, um ponto me fisgou de imediato — tanto pela novidade quanto pela minha ignorância sobre o tema: “Quarta Revolução Industrial”.

O termo foi cunhado por Klaus Schwab, fundador do Fórum Econômico Mundial, e se consolidou no livro “A Quarta Revolução Industrial” (2016).

Nele, Schwab argumenta que vivemos uma transformação impulsionada pela convergência de tecnologias digitais, físicas e biológicas — IA (inteligência artificial), robótica, internet das coisas (IoT), biotecnologia, impressão 3D, blockchain, entre outras.

Ao contrário das revoluções anteriores, esta combina velocidade exponencial, amplitude global e impacto sistêmico, remodelando economias, instituições e relações humanas.

Há oportunidades imensas em produtividade, saúde e sustentabilidade, mas também riscos reais: desigualdade, perda de privacidade e concentração de poder em plataformas digitais.


"Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina." - Cora Coralina
"Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina." - Cora Coralina

Naquele mesmo evento, tive contato com o debate sobre “Educação 4.0” — uma abordagem que combina personalização da aprendizagem, desenvolvimento de competências do século XXI e uso intencional da tecnologia como meio, não como fim.

Foi nesse contexto que encontrei meu segundo grande tema: a aprendizagem socioemocional (ASE).

Se “tecnologia” dá o ritmo da mudança, a ASE dá o compasso humano: como autoconhecimento, autorregulação, empatia, habilidades de relacionamento e tomada de decisão responsável — competências que sustentam a aprendizagem ao longo da vida e a adaptação em ambientes incertos.

Mantenho a percepção de que os sistemas educacionais talvez não consigam reagir na velocidade necessária; nós, pais e educadores, precisamos assumir um papel ativo.

E foi assim que entrei no universo da educação — mais precisamente, da aprendizagem socioemocional.

Em 2014, depois de mergulhar no que o Fórum propunha para a educação — e sob uma carga de trabalho insustentável — vivi um burnout. Foi o corpo, e sobretudo a mente, dizendo “basta”.


“Educar a mente sem educar o coração não é educação de forma alguma." - Aristóteles
“Educar a mente sem educar o coração não é educação de forma alguma." - Aristóteles

De lá para cá, acompanhei avanços — e também ilusões — em torno do que se chamou de “Educação 4.0”: aprendizagens mais personalizadas, foco em competências do século XXI e tecnologia como meio, não como fim.

Do que ouvi naquela ocasião, três temas me pareceram óbvios e, hoje, é exatamente neles que o universo socioemocional mais cresce: inovação, participação cívica e valores. Inovação como a capacidade de experimentar, resolver problemas e criar valor; participação cívica como engajamento responsável com a comunidade e o bem comum; valores como o eixo ético que orienta escolhas e convivência.

Naquele início, confesso: ainda não tinham, para mim, o peso que hoje reconheço. Ajusto a narrativa: demorei a nomeá-los — não a senti-los. Logo ficou claro que eram estruturantes.

Isso se cristalizou no meu período sabático, de março de 2014 a maio de 2016, quando lancei o Método MIDE — Múltiplas Inteligências & Desenvolvimento Emocional — justamente para traduzir esses princípios em práticas concretas.

Passados dez anos atuando com ASE, percebo como minha leitura, na época, era superficial diante do que esses temas realmente significam — e de como precisam estar presentes no dia a dia de qualquer projeto educacional sério.


"O homem não é o que ele tem, nem o que ele faz, mas o que ele é." — Viktor Frankl
"O homem não é o que ele tem, nem o que ele faz, mas o que ele é." — Viktor Frankl

Descobri cedo: valores são o grande ponto cego — não só meu, mas da maioria esmagadora em desenvolvimento humano. Dez anos na linha de frente com pessoas, escolas e empresas deixaram claro: todo desafio socioemocional toca valores, mas quase ninguém sabe trabalhá-los de forma prática.

Fala-se muito sobre valores; quase não se define o que eles significam no dia a dia. E quando ninguém define, ninguém decide. Por isso, no MIDE, valores estão no centro: de sete módulos, um é 100 por cento dedicado a esse tema — uma escolha rara e necessária no campo socioemocional.

Valores, para nós, são critérios de decisão. Orientam o que entra na agenda, definem prioridades e viram comportamento observável. Valor que não vira agenda é opinião. Exemplos objetivos:

Responsabilidade: entregar no combinado.

Respeito: reconhecer a existência do outro.

Foco no cliente: resolver antes de explicar.

Daí a ponte inevitável com inovação. Como inovar sem critérios do que vale e do que não vale a pena? No MIDE Avançado, sistematizamos esse encontro entre inovação e Aprendizagem Socioemocional: visão de futuro ancorada em propósito e práticas de aprendizagem que geram evidência — experimentação, ciclos curtos, protótipos pessoais.

Nada de pirotecnia: método, propósito e entrega. Inovação não é espetáculo; é disciplina a serviço de um chamado. Propósito sem prática vira promessa. Prática sem propósito vira ruído.Ciclos curtos são a bússola em movimento: cada experimento realinha o caminho. Quando o propósito guia, inovação deixa de ser tendência e vira direção — a nossa estrela-guia.


Não siga onde o caminho pode levar. Vá onde não há caminho e deixe uma trilha." - Ralph Waldo Emerson
Não siga onde o caminho pode levar. Vá onde não há caminho e deixe uma trilha." - Ralph Waldo Emerson

O alvoroço em torno da Inteligência Artificial que tomou ruas e redes em 2023 já circulava, uma década antes, entre pesquisadores, no Fórum Econômico Mundial e em universidades de ponta.

Temos uma defasagem entre a realidade e a percepção pública de cerca de dez anos — e, na minha visão, isso é inadmissível. Esse atraso só aprofunda o abismo social.

É hora de ir além de discursos e fóruns que não se traduzem em mudança concreta. Precisamos transformar preocupação em compromisso pessoal e ação prática — cada um fazendo a sua parte, todos os dias, onde realmente importa.

Agora, com a 2ª Geração do meu trabalho se iniciando, a Participação Cívica ganhou o contorno que faltava.

Entendi seu peso e seu significado real: cidadania ativa não começa na urna; começa em casa, segue para a escola, o bairro e a cidade.

Cidadania se conjuga no cotidiano. Uma ASE que não conecta o individual ao coletivo perde metade da força. Participação cívica é a ponte entre autoconsciência e corresponsabilidade. Sem corresponsabilidade, a autoconsciência vira espelho sem saída.

Por isso, famílias e educadores independentes precisam assumir parte dessa formação — com práticas simples, consistentes e humanas, que caibam na vida real. Micro‑hábitos, repetidos, mudam destinos.

Chega de slogans e promessas vagas. O que faz diferença são rotinas possíveis, linguagem clara e ações que qualquer pessoa consiga repetir sem precisar de “autorização” ou de mais um aplicativo. Linguagem clara é respeito e convite à ação.

E esta é a história de como entrei no Universo da Educação, mais precisamente, no Universo da Aprendizagem Socioemocional (ASE). A seguir, compartilho o que aprendi nesses dez anos, o que realmente ficou em pé na prática e o que já está mudando na 2ª Geração do meu trabalho.


"Sozinhos podemos fazer tão pouco; juntos podemos fazer muito." — Helen Keller
"Sozinhos podemos fazer tão pouco; juntos podemos fazer muito." — Helen Keller

As transformações que presenciei nos últimos 10 anos consolidaram meu verdadeiro propósito: inspirar e transformar pessoas, compartilhando irrestritamente meus conhecimentos. Propósito se prova em prática, não em slogan.

Essa jornada solidificou minha visão sobre a aprendizagem socioemocional como a união de três pilares: aprender a ser, aprender a se relacionar e aprender a traçar um caminho que traga sentido às nossas vidas.

Cheguei onde nunca imaginei naquele momento: salas que reuniam pessoas de 13 países. Ver centenas de pessoas em busca do mesmo ideal — definir um sentido para sua existência — foi algo impossível de traduzir em métricas; foi experiência que marca.

Essa experiência global reforçou uma verdade contida no próprio termo: socioemocional. Se formos analisar literalmente, toda relação social é regida pelo emocional. Sem saúde emocional, o tecido social rasga.

Com um emocional tão abalado — seja pelas perdas da pandemia, seja pela ansiedade que a nuvem escura sobre o futuro do trabalho está gerando — a tendência natural é deteriorar ainda mais as relações sociais. Pessoas emocionalmente desestruturadas tornam-se pais, líderes, profissionais e companheiros desestruturados — e, se não agirmos rápido, a tendência é piorar.

A cada dia a pressão só aumenta e deve continuar assim por um bom tempo. Desenvolver competências, principalmente as socioemocionais, é o caminho mais sólido que uma pessoa pode escolher. Competências socioemocionais são infraestrutura humana.

O resultado é uma competição desafiadora e, muitas vezes, injusta: enquanto a educação constrói conhecimento em meses e anos, algoritmos capturam e direcionam a atenção em frações de segundo. Pedagogia disputa segundos com bilhões.

A formação do pensamento crítico enfrenta uma economia da atenção projetada para o engajamento imediato e viciante. Atenção virou mercado; discernimento é contrapeso.


O desenvolvimento pessoal é um processo contínuo de compreender a si mesmo e aos outros." — Stephen Covey
O desenvolvimento pessoal é um processo contínuo de compreender a si mesmo e aos outros." — Stephen Covey

A pressa cobra pedágio invisível. Na corrida para “recuperar o tempo perdido”, muita gente avançou sem perceber o rastro de desgaste socioemocional. Informação demais, presença de menos. E o custo aparece onde mais dói: nas relações.

Os números confirmam o que a prática já gritava. Em 2021, o Brasil bateu recorde de cerca de 420 mil divórcios — alta próxima de 17% sobre o ano anterior. Mais revelador: a maior fatia veio por via extrajudicial, mais rápida. Urgência de virar a página. Ansiedade pela liberdade.

Febre não é a doença. É o alarme. O dado consolida o desfecho, não explica o caminho. Para entender como um vínculo se desfaz, apresento um mapa que ensino aos meus alunos: o Efeito Y.

Imagine a letra “Y”. Duas pessoas — casal, sócios, amigos — caminham juntas por um tronco comum de afinidade e projeto.

Quase imperceptível, surge uma bifurcação: uma mágoa não dita, uma frase mal colocada, um silêncio que ocupa o lugar da conversa. Relações raramente rompem de uma vez; desfiar é o padrão.

Quando se percebe, a distância já parece intransponível e a corda se arrebenta. Esse é o Efeito Y: a construção gradual do fim. Se o rompimento fosse abrupto e visível, seria um Efeito T.

Qual o gatilho que mais acelera o Efeito Y hoje? Décadas de pesquisa apontam uma resposta recorrente. Como mostra o trabalho do Dr. John Gottman, cerca de dois terços dos casais experimentam queda acentuada na satisfação conjugal após o nascimento do primeiro filho. Parentalidade não é um upgrade do casal; é um novo sistema operacional.

A psicologia familiar chama isso de crise normativa — esperada, natural, fruto da reestruturação da vida: novas responsabilidades, pressão financeira e, sobretudo, a ativação de modelos mentais sobre criação e educação que estavam adormecidos.

É o momento em que a mente de “casal” dá lugar à mente de “pais” — e diferenças profundas, antes invisíveis, aparecem com nitidez. Daí a famosa “curva em U” do casamento: começa alta, cai nos anos intensos de criação dos filhos e tende a subir quando eles saem de casa.

Não há solução sem visão sistêmica. Procurar culpados drena energia; entender causas devolve autonomia. O Efeito Y, muitas vezes, brota ainda mais fundo. Há evidências de que memórias e traumas podem ecoar por gerações, influenciando respostas emocionais sem que percebamos. Transgeracional não é sentença; é contexto.

Você, da sua forma, no seu tempo. Não existe fórmula pronta quando lidamos com emoção — mas existem mapas. O Efeito Y ajuda a enxergar fissuras antes que virem fraturas.


"Não existe um caminho para a felicidade. A felicidade é o caminho.” - Mahatma Gandhi
"Não existe um caminho para a felicidade. A felicidade é o caminho.” - Mahatma Gandhi

É preciso corrigir uma percepção comum.

Não considero justo dizer que a pandemia “causou” a desordem relacional.

O que vimos foi um acelerador em potência máxima. O isolamento, a incerteza e a sobrecarga apenas trouxeram à superfície fragilidades que já estavam acumuladas. A tampa saiu. A pressão mostrou o que já existia.

Esse processo criou um efeito dominó. Onde faltaram competências socioemocionais, as rachaduras viraram rupturas: entre pais e filhos, em sociedades empresariais, em equipes inteiras e em carreiras promissoras.

Famílias se esfarelando ao longo da jornada; sociedades dissolvendo-se por conflitos evitáveis; profissionais tecnicamente brilhantes patinando sem entender por quê.

A verdade incômoda do mercado é simples: a competência técnica te contrata; é a inteligência emocional que te promove e te mantém relevante.

Nada disso é novo. A erosão das relações, que parece tão “moderna”, é uma batalha antiga. A aprendizagem socioemocional tem raízes na sabedoria milenar. Mergulhe em qualquer grande tradição — estoicos, aristotélicos, budistas, confucionistas — e verá o mesmo alicerce: autoconsciência, autocontrole, coragem, compaixão, prudência, responsabilidade.

O que muda não é o fundamento; é o ambiente de aplicação.

E é aqui que mora o ponto mais alarmante. Se as raízes do problema são antigas, o campo de batalha de hoje é novo — e mais traiçoeiro.

A 4ª Revolução Industrial, com sua velocidade, automação e inteligência artificial, não afeta apenas processos; ela pressiona o nervo das relações humanas: atenção, presença, confiança, cooperação.

A economia da atenção sequestra foco; a hiperconexão fragmenta presença; notificações constantes trocam conversa por reatividade; trabalho remoto/híbrido exige regras novas para vínculos que antes vinham “no automático”.

A própria ciência ainda não consegue medir a totalidade dos impactos desse rearranjo. O que já se sabe é suficiente para um veredito prático: desenvolvimento socioemocional deixou de ser opção ou diferencial “soft”. É questão de sobrevivência — pessoal, relacional e profissional. Em ambientes de alta velocidade, o que não é intencional vira acidental. E em relações, o acidental custa caro.


"O eco que você ouve é o reflexo do som que você faz." - Provérbio Chinês
"O eco que você ouve é o reflexo do som que você faz." - Provérbio Chinês

Em resumo, a lição destes últimos 10 anos de jornada é clara: enquanto o mundo enfrenta os desafios transformadores da 4ª Revolução Industrial, nunca foi tão crucial investir nas pessoas. Qualquer visão de futuro precisa partir deste princípio. A questão que se impõe é: "Como garantir que nossa visão de mundo e nossas habilidades permaneçam relevantes na próxima década?"

Isso nos leva ao paradoxo central do trabalho no século 21. A crença de que a tecnologia apenas transformaria empregos, sem eliminá-los, já se provou otimista demais. Haverá, sim, uma escassez de vagas tradicionais e, ao mesmo tempo, surgirão carreiras que hoje nem existem. O risco real é um abismo entre as vagas do futuro e uma grave falta de talentos qualificados para preenchê-las.

E qual é a qualificação mais decisiva nesse cenário? A resposta não é uma opinião, está nos dados. Um levantamento feito pelo LinkedIn é taxativo: 87% das demissões são causadas por problemas comportamentais, contra apenas 13% por falta de conhecimento técnico. Isso prova que as empresas preferem investir na capacitação técnica de um profissional que agrega e equilibra ao ambiente, a arriscar contratar alguém tecnicamente bom, mas relacionalmente destrutivo.

É exatamente para construir essa ponte — para qualificar pessoas para um futuro que exige mais do que conhecimento técnico — que nasce o que estou chamando de MIDE 2ª Geração: a evolução da aprendizagem socioemocional aplicada às demandas da 4ª Revolução Industrial.

Esta nova fase do meu trabalho vai além do desenvolvimento tradicional. É um manifesto contra a massificação do desenvolvimento humano. É a integração consciente entre quem somos, como nos relacionamos e o que criamos. É uma disciplina desenhada para transformar líderes em seres humanos mais livres e autoconscientes, capazes de dar propósito e direção não apenas às suas próprias vidas, mas a todas as vidas que tocam.

Porque este é o paradoxo final que precisamos enfrentar: em um mundo cada vez mais conectado pela tecnologia, vemos um aumento preocupante na desconexão entre as pessoas. Não basta mais ter o conhecimento; é preciso resgatar nossa capacidade de aprender, adaptar e, acima de tudo, interagir humanamente. A verdadeira revolução não está nas máquinas — está em nos tornarmos mais humanos.


"A verdadeira revolução na educação não está em ensinar mais, mas em ensinar diferente." - Howard Gardner
"A verdadeira revolução na educação não está em ensinar mais, mas em ensinar diferente." - Howard Gardner

Diante deste cenário, o Brasil fez um movimento correto. Com a nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o país sinalizou uma mudança de paradigma, orientando toda a educação para o desenvolvimento de competências. A proposta é clara: superar a fragmentação do conhecimento, estimular sua aplicação na vida real e dar protagonismo ao estudante na construção do seu projeto de vida.

Em essência, a lei redefine o sucesso educacional. Competência, segundo a BNCC, não é mais memorizar fatos, mas sim a capacidade de mobilizar conhecimentos, habilidades práticas, cognitivas e socioemocionais, além de atitudes e valores, para resolver as demandas complexas da vida.

E aqui reside um ponto crucial que muitos desconhecem: isso não é uma sugestão pedagógica. A Educação Socioemocional e o Projeto de Vida são, por força da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), exigências legais e obrigatórias em toda a educação básica do país. A ausência de sua aplicação configura um descumprimento da diretriz curricular nacional.

Diante de uma legislação tão robusta e visionária, a pergunta é inevitável: o problema está resolvido?

Após passar os últimos dois anos imerso na realidade de diversas escolas, minha resposta é um "sim" no papel e um "não" na prática. A BNCC é, de fato, um documento à frente de seu tempo — e precisava ser, dada a urgência das transformações que enfrentamos.

Contudo, minha observação em campo me leva a uma conclusão preocupante: não acredito que, no ritmo atual de implementação e formação de educadores, a lei sozinha trará os efeitos necessários para a geração que estará ingressando no mercado de trabalho entre 2035 e 2040. Há uma lacuna imensa entre a intenção da lei e sua execução efetiva na sala de aula.

Esta lacuna não é apenas um problema técnico ou de recursos — é um desafio que exige uma abordagem completamente nova para a formação socioemocional. É exatamente aqui que o MIDE 2ª Geração encontra seu propósito mais urgente.


"Inovação é a capacidade de ver a mudança como uma oportunidade – não como uma ameaça.” — Steve Jobs
"Inovação é a capacidade de ver a mudança como uma oportunidade – não como uma ameaça.” — Steve Jobs

A conclusão, dura e inevitável, é que temos um documento moderno para um país que não possui as condições mínimas para interpretá-lo, e muito menos para implementá-lo.

Para entender a dimensão real do nosso desafio, basta analisar a introdução da aprendizagem socioemocional na China. Estou citando o gigante asiático por duas razões: primeiro, porque eles estão vencendo o jogo do desenvolvimento socioeconômico; segundo, porque, assim como o Brasil, são um país continental.

A diferença é que eles estão há 25 anos lutando para implementar essa visão em uma cultura milenar e homogênea, e ainda enfrentam dificuldades. Nós, por outro lado, tentaremos fazer o mesmo em um país com infraestrutura educacional precária e uma diversidade cultural colossal e recente.

Contudo, o problema brasileiro é ainda mais profundo que a falta de recursos e a complexidade cultural. Nós estamos errando na própria essência da implementação.

A Universidade de Harvard, em 2019, definiu a aprendizagem socioemocional (ASE) como um conjunto de habilidades não acadêmicas para gerenciar comportamentos, construir relações e processar informações.

A maioria das escolas, no entanto, transformou a aprendizagem socioemocional (ASE) em mais uma disciplina acadêmica, um trabalho protocolar para satisfazer o MEC e as famílias. Isso não vai funcionar, pois fere a própria base do conceito: o desenvolvimento de habilidades para interagir e responder aos outros de forma pró-social, e não apenas para preencher um currículo.

É por reconhecer essa falha estratégica que, nesta segunda fase do meu trabalho, meu foco continuará sendo o de atuar diretamente com adultos — em cursos, workshops e, principalmente, dentro de empresas.

O modelo ideal de transformação seria "escolas em parceria com as famílias" ou "empresas em parceria com as famílias". Mas a abordagem atual, focada apenas nos jovens que frequentemente não recebem reforço socioemocional em casa, repete um erro que já se provou ineficaz no mundo todo.

Minha esperança e minha ação estão em capacitar os adultos que, por sua vez, impactarão suas famílias e ambientes de trabalho.

Ao final, o objetivo transcende qualquer metodologia. Não basta desenvolver competências técnicas isoladas. É preciso olhar para o "Ser Humano Integral". Apenas quando as pessoas puderem se desenvolver em sua totalidade, será possível criar os ambientes de relacionamento éticos e emocionalmente saudáveis que tanto buscamos.

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